Educação Especial:
Leitura Reflexiva
SURDEZ – Visão médico – patológica x visão sociocultural, impactando na
educação dos surdos
A aceitação do estranho, do diferente, do deficiente sempre foi um problema para o outro, para a sociedade
ao longo da história das civilizações.
No caso dos indivíduos surdos, durante a Antiguidade e até o início da
Idade Média, pensava-se que eles não eram educáveis.
Eles eram rotulados como imbecis, “idiotas”, vistos
como incapacitados para aprender.
Foram subjulgados e obrigados a comunicarem-se por meio de uma
língua que lhes é estranha, a língua oral.
A partir daí, temos uma longa (e triste) história sobre os surdos, que já foi exaustivamente relatada por
brilhantes autores como Carlos M. Sânchez, Oliver W. Sacks, dentre outros.
Mais recentemente e até os
nossos dias, o debate sobre o indivíduo surdo apresenta duas posições antagônicas: a visão médico patológica
(ou médico-organicista) e a pssicossocioantropológica (também conhecida como visão
sociocultural).
Vejamos, resumidamente, a posição de cada uma dessas visões, com o consequente impacto
na área da educação dos surdos.
A VISÃO MÉDICO-PATOLÓGICA (OU ORGANICISTA) DA SURDEZ
Desde o início de sua história, a educação dos surdos sujeitou-se à orientação de um profissional da área
médica (o médico Jerônimo Cardan).
Tal influência médica foi se consolidando, estando presente, inclusive,
no Instituto de Surdos de Paris, primeira escola especial de surdos – fundada pelo abade francês Charles
Michel de L’Epèe (1712 – 1789) – cuja administração posteriormente ficaria sob responsabilidade do médico
Jean Itard.
Talvez aqui tenha se dado o início do que viria a se consolidar como uma visão médico-patológica
da surdez, predominante por longos anos no campo da educação de surdos.
Comungam dessa visão a corrente de autores que focaliza a surdez apenas no âmbito clínico-patológico ou
médico-organicista. Nela, o surdo é visto como um deficiente que precisa da reabilitação para alcançar uma
condição fisiológica semelhante à dos ouvintes.
Tal visão prioriza o problema biológico da falta de audição e
da dificuldade (ou até ausência) da fala oral. Os defensores de visão, geralmente, estão interessados nos
aspectos neuro-sensoriais sobretudo no tocante à capacidade/incapacidade de audição e fala oral do surdo.
Desse modo, indicam aos surdos, prioritariamente, o caminho da educação/reeducação (ou reabilitação) da
audição/fala oral. Entendem eles que, sem tal reabilitação, dificilmente, esses indivíduos integrariam a
sociedade majoritária, que é de ouvintes.
Assim, nessa corrente, os autores defendem que a “reabilitação” da
surdez, o que pode se efetivar por meio de treino fonoarticulatório (terapia que possibilite a fala oral), a
leitura labial e pela ampliação do resíduo auditivo.
Para isso, é imprescindível a utilização de aparelhos de
amplificação sonora, próteses auditivas, implantes coclear, dentre outras técnicas/instrumentos modernos na
linha das tecnologias assitivas. Um indivíduo que é considerado como tendo suas habilidades dentro do
padrão esperado pela medicina é aquele que consegue captar ondas sonoras em várias frequências
diferentes passando pelo processo completo, da detecção à decodificação do som.
O American National Standarts Institute (ANSI – 1989) define uma escala em decibéis (dB). Nessa escala, o db
corresponde ao zero audiométrico, e agrega várias frequências comuns em Hertz (Hz).
A faixa de 0 a
aproximadamente 20 a 24 decibéis (ou 26 db) corresponde ao nível natural de audição nos humanos, sendo
que limiares de perda acima de 25 decibéis (em algumas frequências, conforme testes com audiogramas de
250, 500, 1.000, 2.000, 3.000, 4.000, 6.000 e 8.000 hz), já pode ser considerada uma deficiência de audição.
Também, os níveis da deficiência são classificados de acordo com as diferenças no limiar de detecção em dB.
Desse modo, geralmente, o indivíduo é classificado como tendo perda leve, moderada, severa e profunda.
Nesse sentido, os indivíduos com perda auditiva em níveis leve, moderado e severo são chamados de
deficientes auditivos.
Os com nível profundo são chamados surdos. Luis Behares é uma dos autores que criticam o uso de
expressões como deficientes auditivos, por remeter à visão médico-organicista.
Para ele, principalmente na
escolarização do surdo, o grau de perda auditiva indicado pelo diagnóstico médico e/ou paramédico tem sido
decisivo no encaminhamento educacional, configurando-se como o mais importante indicador para a
previsão do desenvolvimento de linguagem.
Isso porque, na visão médico-organicista, é imprescindível
conhecer os aspectos patológicos e fisiológicos da surdez a fim de que se possa desenvolver um trabalho
educativo com esse indivíduo.
Tal visão pretende aproximar o surdo o máximo possível do ouvinte, eu é o “modelo-padrão”.
Assim, resistese
a aceitar a diferença desse indivíduo, já que ele destoa da norma socialmente estabelecida. Na visão
médico- patológica, os padrões classificatórios não são apenas indícios. São considerados os mais importantes
indicadores para a previsão de desenvolvimento da criança surda, tanto em termos linguísticos com
educacionais.
Assim, desprezam-se, ou se coloca em segundo plano, outros fatores que não se refiram ao tipo e grau de
perda auditiva.